A Terapia Focada na Compaixão (CFT, em inglês) utiliza várias bases científicas para proporcionar mudanças significativas nos pacientes. Uma destas bases é a teoria da evolução aliada às recentes descobertas da neurociência.
Por exemplo, muitas pesquisas mostram que temos uma maior tendência de focar em aspectos negativos dos fatos e eventos e, igualmente, uma tendência maior de lembrar do que foi ruim do que o que foi bom. Porque isso acontece?
Uma possível explicação da teoria da evolução na psicologia, ou psicologia evolutiva, é de que os nossos ancestrais que estavam mais atentos à situações de perigo conseguiram sobreviver. Sobrevivendo, eles passaram os seus genes adiante e, consequentemente, herdamos a tendência de focar mais no negativo, com o objetivo implícito de nos proteger.
Neste texto, vamos falar de 3 grupo ou sistemas de emoções que todos nós temos. Só saber disso já pode ajudar a criarmos uma outra relação com as nossas emoções, entendendo-as não como um “distúrbio” individual, só meu, mas como algo que nos traz a chamada humanidade compartilhada: a consciência de que, apesar das diferenças entre nós, todos nós temos características que se assemelham – como estes três sistemas herdados dos nossos antepassados.
1) Sistema de alerta ao perigo (que possibilita proteção)
Emoções como medo, ansiedade, raiva são geralmente classificadas como negativas, muitas vezes pensadas como um transtorno mental. Para a Terapia Focada na Compaixão estas emoções fazem parte do nosso sistema que nos alerta sobre perigos e tem como finalidade nos proteger.
Imaginando como seria a vida de nossos ancestrais mais antigos, há milhares de anos, podemos considerar que as dificuldades eram grandes: ameaças de animais predadores, ameaças de outros grupos que poderiam ser violentos, intempéries climáticas, etc. Com isso, fazia muito sentido ter um sistema de alerta e proteção: medo, ansiedade, raiva, certo?
Portanto, se pensarmos que herdamos esse sistema dos nossos antepassados, teremos consciência de que não é um problema meu ter ansiedade, por exemplo. O corpo tem embutido um mecanismo que vem lá do passado distante, que tinha como objetivo dar segurança e proteção, como também pode me proteger hoje.
Esse sistema está particularmente relacionado com amígdala, hipotálamo e pituitária. É a famosa resposta luta ou fuga.
2) Sistema de busca (que possibilita adquirir coisas e atingir objetivos)
Outro sistema que também recebemos, como seres humanos, é o sistema que possibilita buscar recursos, atingir metas e conquistar coisas. Podemos também imaginar antepassados distante: aqueles que iam atrás de comida, abrigo, parceiros sexuais também tinham mais chances de sobreviver e passar seus genes para frente.
Portanto, também temos esse sistema de emoções que aparecem, por exemplo, como ambição, desejo, excitação.
Este sistema está relacionado com a produção de dopamina, que nos ajuda a ver possibilidades de realizar objetivos, mantém a nossa atenção em direção do que buscamos e traz satisfação e prazer quando os objetivos são realizados.
Todos nós conseguimos reconhecer estes dois sistemas, de aversão (a um risco, problema, dificuldade, perigo) e desejo (e procura de algo que o satisfaça).
Em princípio, estes dois sistemas foram e continuam sendo úteis. O problema, que aparece no consultório como sofrimento, é quando um ou os dois sistemas estão super ativados. Por exemplo, quando racionalmente não há nada a temer em uma situação como uma reunião de trabalho e a resposta emocional e física é como se fosse uma ameaça real de morte. Ou quando tudo está relativamente bem na vida, e ainda assim temos a sensação de insatisfação porque o sistema 2 continua em busca de algo (não necessário para o momento).
3) O sistema de calma e contentamento (ligado à compaixão)
Este sistema está relacionado com se sentir contente e calmo, em paz, em segurança. Quando está bem, quando não há ameaças reais (ou imaginadas), nem uma busca desenfreada (e muitas vezes sem sentido) este sistema é ativado. Em outras palavras, o sistema ligado à compaixão muitas vezes é desconhecido das pessoas, pois os outros dois sistemas estão muito ativos.
A boa notícia é que podemos aprender a equilibrar estes três sistemas, aumentando a disponibilidade do sistema 3: através de práticas de compaixão e autocompaixão, aceitação, bondade e pertencimento a um grupo.
O sistema de compaixão, no corpo, está associado à presença de ocitocina e endorfina, que ajudam a diminuir o estresse, melhoram o sistema imunológico e reduz a ativação da amígdala.
Conclusão
A Terapia Focada na Compaixão, portanto, vai ajudar os pacientes a reconhecer que muitas emoções que são pensadas como negativas tem um sentido histórico, evolutivo e que serviu à sobrevivência no passado – e inclusive continua nos ajudando hoje a reconhecer perigos e nos proteger.
Outro objetivo desta abordagem é aumentar a presença de emoções ligadas ao sistema de compaixão, de calma, de contentamento que é alimentado e alimenta os contatos sociais positivos.
Referencia
KOLTS, Russel. CFT made simple. New Harbinger, 2016
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