As distorções cognitivas são como lentes com foco distorcido que são usadas para ver o mundo, a si e o outro e causam transtornos emocionais.
A terapia racional-emotiva de Albert Ellis é uma das vertentes das terapias cognitivo-comportamentais. Neste texto, procuraremos falar sobre os principais pontos da teoria e prática de Ellis.
Entre o estímulo e a resposta
A ideia do filósofo Epiteto de que “não sofremos pelas coisas, mas sim pelo modo como vemos as coisas” é central na terapia racional-emotiva. Entre o estímulo e a resposta há um elemento fundamental: a nossa interpretação sobre o estímulo. Se uma criança cai, ela pode imediatamente interpretar o tombo como horrível ou como algo engraçado. A resposta de chorar ou de rir virá não a partir do estímulo inicial e sim da interpretação.
Ellis explica esta questão através das letras ABC. A é o acontecimento. B vem da palavra Belief, crença, em inglês e C é a consequência. Se não houvesse o ponto do meio do B, das crenças, todas as pessoas reagiriam do mesmo modo frente à um mesmo estímulo.
Por exemplo, se não houvesse a crença mediando a relação entre o acontecimento e a consequência, a resposta, todo final de relacionamento poderia ser visto como triste. E sabemos que não é o caso. O acontecimento de terminar uma relação pode ser sentido como um alívio, como felicidade, como liberdade, etc; pois dependendo da crença sobre o que a relação significou a consequência terá lugar. Se a pessoa pensa que o seu parceiro ou parceira era o amor de sua vida, ficará desconsolada e até deprimida. Se, por outro lado, entende que separar é a melhor coisa que aconteceu então ficará alegre.
Portanto, tanto os comportamentos como as emoções aparecem a partir das crenças que temos e mantemos.
Devo que…tenho que
Com a sua enorme experiência clínica, Ellis defende a ideia de que os transtornos psicológicos se baseiam em crenças absolutistas de “devo que” ou “tenho que” sobre si mesmo, sobre os outros (ele, ela, eles devem, tem que) e sobre o mundo (que deveria ser… tem que ser…). Embora possam até parecer racionais, tais crenças não são e causam muitos problemas afetivos e de motivação, muitas vezes paralisando o sujeito na busca de seus sonhos.
Decorrem dos devo que… tenho que…
- Catastrofização: a tendência de avaliar (a si, ao outro, ao mundo) como totalmente mau, pois há a ideia de que não deveria ou poderia ser como é;
- “Não vou suportar”: a ideia de que não será possível suportar isso agora ou o que pode vir a acontecer. Se tal fato tem que ocorrer, e ele não está ocorrendo, ou pode vir a se transformar, cria-se a ideia de que se aquilo que acho que deve acontecer não acontece, a pessoa não vai aguentar.
- Condenação: Ao entender que o valor de uma pessoa (ou de si) advém do seu comportamento, que se alinha ao que deve ou tem que ser…, a pessoa passa a condenar ao outro ou a si de acordo com seus parâmetros.
12 distorções cognitivas
Ellis levanta 12 distorções principais que se baseiam também na lógica do devo… tenho que e que causam consequências negativas dentro do esquema ABC:
- Pensamento de tudo ou nada
“Se erro ou fracasso, sou um total fracasso”. Neste tipo de pensamento de tudo ou nada, a realidade é dividida em 8 ou 80.
- Saltando às conclusões negativas
“Se fiz isso que não devia, me verão como uma pessoa horrível”. As conclusões retiradas das premissas são negativas.
- Adivinhar o futuro
“Como deixei de fazer isso que tinha que fazer, nunca mais serei apreciado no futuro”. O futuro é projetado como real, certo e de maneira pessimista.
- Centrando-se no negativo
“Não suporto isso que está acontecendo, tudo parece perdido”. O foco da atenção está em tudo o que não tinha que ou deveria, portanto, o negativo sobre tudo tem prevalência.
- Desqualificando o positivo
“Isso é até legal, mas não importa porque não significa de fato nada importante”. O positivo das situações é até visualizado, mas logo descartado.
- Sempre e nunca
“Isso foi sempre assim, nunca será diferente, embora deveria ser”. Não se percebe, no pensamento de sempre-nunca, que a realidade se transforma a todo momento.
- Minimização
“O que consegui foi por sorte e não por capacidade”. Neste tipo de pensamento, tudo o que é positivo sobre si ou outro é minimizado.
- Raciocínio emocional
“Não deveria me sentir desse jeito e me sentir desse jeito mostra como não sou bom”. Aqui há uma racionalização da emoção de modo que uma determinada emoção não deveria ser sentida e o fato de sentir prova a inadequação.
- Rotulação e supergeneralização
“Sou uma desgraça e não fiz nada da minha vida”. Há a criação de um rótulo fixo e uma generalização absoluta e absurda.
- Personalização
“Ao andar na rua, as pessoas olham e riem de mim”. Nesta forma, tudo é trazido para o eu, como se todas as coisas negativas ou até mesmo neutras fossem sobre si mesmo.
- Falseamento
“Logo vão descobrir que sou uma fraude e que não faço as coisas direito”. Aqui o pensamento é parecido com a famosa síndrome do impostor, a ideia de que não se é capaz e que mais cedo ou mais tarde será descoberto.
- Perfeccionismo
E, finalmente, o perfeccionismo consiste no pensamento de que é sempre possível fazer algo perfeito e que, no fundo, “eu nunca fiz ou nunca atingirei esse nível”.
Conclusão
Embora os terapeutas da vertente da linha racional-emotiva investiguem e procurem ajudar os pacientes a mudarem estas 12 distorções, é consenso entre eles que o central é a modificação dos pensamentos “devo que”, “tenho que”, pois eles são as crenças centrais a partir das quais os pensamentos ilógicos e disfuncionais aparecem.
Parabéns professor, muito bom!