As séries de TV de investigação criminal retratam o trabalho da psicologia jurídica?
Olá amigos!
Na última década vimos surgir diversas séries de TV, especialmente nos Estados Unidos, em que há a presença de psicólogos ou personagens com conhecimentos de psicologia que trabalham investigando crimes, suspeitos, levantando perfis de serial killers, ou seja, trabalhando no que podemos chamar de psicologia criminal.
Veja aqui – Psicologia e Séries de TV: Lista Completa
Por isso, recebo frequentemente emails e comentários de pessoas que gostam muito destas séries e gostariam de fazer o mesmo, ou seja, estudar psicologia para investigar crimes.
Desde a época do CSI, entretanto, sabemos que este tipo de série é bem distante da realidade. Pessoas que trabalham nestes setores nos Estados Unidos dizem que os recursos disponíveis para os personagens da série não estão disponíveis para eles. Além dos recursos, podemos imaginar que muitos outros detalhes estão distantes do dia a dia da profissão. Então, imagine em nosso país!
Aqui, sabemos que o caminho para investigar crimes não está ligado a fazer a faculdade de psicologia. Para ser um detetive ou um delegado, por exemplo, uma faculdade mais próxima é a faculdade de direito. E faz todo o sentido porque é preciso conhecer a lei para investigar o que está fora da lei, assim como o conhecimento legal permitirá com que o profissional não a extrapole, ainda que tenha intenções supostamente positivas.
Mas o que dizer da psicologia jurídica ou psicologia forense? Não existe?
Psicologia jurídica: uma especialização da psicologia no Brasil
A área de interseção entre psicologia e direito é a psicologia jurídica. Em outros países, ouvimos falar de psicologia forense ou mesmo psicologia criminal. Em tese, o nome não importa tanto, desde que conheçamos o que faz de verdade o psicólogo nesta linha de atuação.
Para saber os detalhes das funções e da formação necessária para trabalhar, confira o nosso texto – Psicologia juridica: definição, salário e atuação (as 14 definições do Conselho Federal de Psicologia não incluem a investigação).
Mas não faz sentido dizermos que a atuação da psicologia em nosso país exclui de todo a relação com a justiça e com as leis. Entretanto, é preciso salientar – e salientar bastante – que o que o psicólogo ou a psicóloga faz de segunda a sexta como psicóloga jurídica será muito diferente de séries como CSI, Criminal Minds, Lie to Me e etc.
Para dar uma ideia mais precisa, o trabalho vai estar mais ligado à atuação na área cível. Por exemplo, avaliar se uma criança está sendo maltratada, se é mais adequado que fique com o pai ou com a mãe ou ajudar na conciliação de conflitos, como na separação de casais ou disputas entre herdeiros. O nome a ser pesquisado para maiores informações é mediação de conflitos.
Além do campo de atuação ligado à família também pode existir a demanda por laudos e perícias, ou seja, o que envolve a avaliação de perfis e personalidades.
A avaliação de suspeitos
Como qualquer um sabe, apesar de sermos um dos países mais ricos do mundo (somos a 7° economia mais rica!), existe um problema de alocação de recursos em diversos setores por parte do governo. Isto se reflete nas estatísticas: “Por ano, são mais de 50 mil mortes no país. E os casos em que os assassinos são punidos não chegam sequer a 8%” (Fonte: Jornal O Globo). De modo que 90% dos crimes acaba sem solução.
Se é deste modo a realidade atual, é ingenuidade achar que o governo contrataria uma rede de psicólogos para ir atrás de possíveis suspeitos, fazer testes e avaliações aprofundadas. Além disso, a maioria dos crimes não necessitaria de uma investigação de personalidade apurado (o que levaria a um diagnóstico psicopatológico que, em última análise, seria utilizado para averiguar se a pessoa é passível de pena ou não).
Digo que não necessitaria porque a maior parte dos crimes se resume a duas situações:
– dinheiro
– crimes passionais
E esta asserção não é apenas aqui e apenas agora. Por isso, existem dois lemas de investigação que são: “Follow the money” (siga o dinheiro) e “cherchez la femme” (procure a mulher), ou seja, ao seguir a rota do dinheiro ou buscar as causas monetárias é possível solucionar uma parte dos crimes. Por exemplo, assassinatos em que o assassino estava interessado em se apropriar dos bens do assassinado. E, ao procurar a mulher – ou o homem – a polícia investiga os relacionamentos afetivos, amorosos e sexuais para descobrir motivações ligadas a estes comportamentos como ciúmes, vingança, etc.
Além destes dois tipos de situações, também existem os casos ligados à doenças mentais como o sujeito que está passando por um surto psicótico e mata a família. A motivação não é por dinheiro ou por paixões e sim pela doença mental subjacente.
Isto posto, devemos imaginar que toda a rede jurídica composta por juízes, advogados, delegados e outros profissionais precisaria dos serviços de um profissional da psicologia quando?
Voltamos à área da família, ao responder, mais do que a área criminal propriamente dita. Um juiz pode pedir que uma criança de 6 anos seja avaliada se sofreu ou não abuso ou se uma pessoa não está lúcida e deve ser interditada. Acontece de em casos de juri popular uma avaliação seja pedida. Porém, devemos nos lembrar que também existe a psiquiatria forense e, portanto, um psiquiatra talvez ocupe o lugar.
Conclusão
As séries de TV que retratam os profissionais com conhecimentos de psicologia ou psicólogos atuando na investigação de crimes não são verossímeis. Além de retratarem uma realidade de outros países (e serem fictícias até se compararmos a realidade lá com a série), em nosso país a realidade é ainda outra no que tange à investigação, como vimos.
Por isso, ao escolher uma faculdade e uma profissão, temos que sair da imaginação e investigar o dia a dia da carreira. Apesar de ser uma área bem remunerada na psicologia, a psicologia jurídica não é um campo de atuação muito vasto. Em outras palavras, não existem tantas vagas em concursos quanto se poderia querer ou esperar.
Eu, que sou formado há quase 10 anos, e tenho contato com psicólogos de todo o Brasil, nunca tive conhecimento de um colega que atue na psicologia jurídica, ao menos nunca conheci pessoalmente. Aqui no site, uma querida colega já postou que trabalha como psicóloga jurídica. Claro que esta não é uma estatística precisa, mas demonstra que esta área não acolhe tantos profissionais como a psicologia clínica, organizacional ou social.
Dúvidas, sugestões, comentários, por favor, escreva abaixo!
Que bom que você esclareceu esse tema! tem gente achando que ser psicólogo criminal é acompanhar uma equipe multidisciplinar acompanhada de elegantes profissionais iguais ao da TV. Parabéns pela iniciativa.
Belo texto Felipe, acredito que a Psicologia Jurídica/Forense aqui no Brasil é um campo muito fechado, dificilmente você vê profissionais que atuem na área. Claro que existe, já fui em algumas palestras durante a faculdade, mas que também são poucas.
Até pra especialização nessa área sinto uma certa “carência” não se vê muito por ai!
Abraços,
Boa noite professor!
Poxa e eu pensei que trabalharia inclusive com aquelas agentes lindas e maravilhosas como da série …poxa professor que banho de agua gelada hein , rssss
Um grande abraço.
Sergio
Olá professor, gosto muito dos seus textos, sempre leio eles, estou no 2° período de psi e entrei querendo muito essa área, a jurídica, criminal e forense rsrs, com esse texto tirei muitas dúvidas, mais pot admirar muito essa área ainda fica a duvida se vale a pena eu me dedicar a isso, gostaria da sua opinião pois sempre que leio sobre o assunto é como se me desmotivase por conta dos pontos negativos, que são muitos! Obrigada
Felipe, sou Psicologa e pos graduada em Psicologia Juridica, atuo como Perita Judicial na Justiça do Trabalho. Qualquer duvida estou a disposição.Inclusive vou ministrar um curso em SP e BA para formação de Psicologos Peritos.
Grata
Deise
11 4198 5900
Vou deixar meu email para futuros contatos ou dúvidas.
deisepericias@gmail.com
Adoro os seus textos!!!
Muito esclarecedores.
Olá,
Tenho uma enorme vontade de fazer o curso de psicologia, hoje estou próximo de completar 31 anos, como é o mercado para uma pessoa que se forma após os 35 anos? Desde já obrigada!
Olá Evelyn,
Veja aqui – https://psicologiamsn20220322.mystagingwebsite.com/2013/07/a-idade-influencia-ao-entrar-no-mercado-de-trabalho.html
Atenciosamente,
Felipe de Souza
oi, gosto muito dessa área e penso em no futuro, cursa-la, gostaria de saber sua opinião sobre uma série de TV chamada investigação discovery, na série, fala que são casos reais, acha que cursar essa profissão por incentivo dessa série seria uma boa ideia ?
Olá Agnes,
Infelizmente não conheço a série.
Bem, imagino que seja relacionado ao tema do texto. Então, é uma possibilidade bastante remota enquanto campo de atuação aqui no Brasil. Mas áreas afins, mais ligadas à pesquisa, sempre apresentam outras possibilidades, ok?
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Boa tarde dr fique muito tempo sem ler os textos porque a minha situação de saúde não estava bem,agora ja to no ativo, muito obrigada dr.
Boa noite Professor Felipe,
Tenho acompanhado seu site desde que comecei o curso de psicologia, estou no 4º semestre e estou muito interessada na área da Psicologia jurídica. Gostaria de saber se tem uma linha especifica que o profissional deve seguir para ser da psicologia jurídica, por exemplo o behaviorismo ou a psicanalise. Gostaria de saber também quais instituições oferecem a pós graduação, ou a especialização nessa área.
Desde já agradeço.
Adna Rodrigues
Olá Adna,
Em princípio não existe uma pré-determinação de qual abordagem deve ou pode ser usada, ok?
Vai depender muito dos autores especialistas ou dos professores que dão as disciplinas.
Quanto à pós, é mais fácil você pesquisar no google por instituições próximas a você.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Olá, Felipe, sou psicóloga jurídica com atuação na área há 31 anos, Professora Adjunta do Curso de Psicologia da UNIFESP, e conheço vários psicólogos na área. Embora minoria entre os psicólogos, podemos dizer que somos uma minoria bastante expressiva, influindo inclusive na formulação de leis, como p novo Código Civil, por exemplo.
Olá Marta!
Obrigado por comentar!
Sim, claro! Não quis de maneira nenhuma minimizar a importância. Sinto que é uma pena que não existam tantas oportunidades como em outras áreas.
Se em algum momento você se dispuser a escrever um texto como é a sua atuação, ajudará muito a todos!
Meu email é psicologiamsn@gmail.com
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Olá, Felipe, aqui vai um deles:
http://www.scielo.br/pdf/pcp/v32n4/v32n4a10.pdf
Abraço,
Marta
Obrigado Marta!
Trabalho em um fórum, como psicóloga judicial. É assim que se diz: psicólogos judiciais. Em nada a atuação remete às séries estrangeiras ou mesmo aó que é mencionado sobre a atuação no Brasil. Mas o trabalho é interessante, sofrido, frustrante, porque não temos suporte de rede de saúde mental e de assitência social, independemente de quem ou qual partido esteja no governo municipal, estadual ou federal. Posso considerar que é bem remunerado. Em MG o TJMG está em plena campanha para prejudicar a carreira de todo o funcionalismo do judiciário. Atualmente vivenciamos dificuldade para evoluírmos na carreira. Não há incentivo qualquer é são criadas dificuldades. A prática da psicologia judicial envolve trabalho nas Varas de Família, Infância e Juventude, processos gerados à partir da Lei Maria da Penha, e que visam resguardar direitos de idosos e incapazes. Dentro dos presídios existem psicólogos, mas eles não trabalham como nas séries de TV. A polícia conta de modo ínfimo com este profissional, que muitas vezes, atua de forma pouco ética, talvez de modo mais policialiesco. Só pra se ter uma idéia. Para trabalhar na área tem que ser aprovado em concurso público. É cargo de provimento efetivo. Somos os peritos de confiança dos Juízes. Há muita cobrança quanto à execução rápida do trabalho, que é avaliativo.
Obrigado por compartilhar sua experiência conosco Betania!