Enquanto a tabela do CFP diz que o valor mínimo de uma psicoterapia deveria ser de 80 reais, os planos de saúde chegam a pagar menos de 20 reais.
Olá amigos!
Há um tempo atrás eu escrevi o texto – Por que os psicólogos ganham tão mal? – e uma querida leitora abordou a questão dos planos de saúde, que não havia sido tratada no texto. A fim de abrir a discussão, vou então colocar alguns pontos para que os profissionais que desejam possam concordar ou discordar nos comentários e para quem, por ventura, estiver querendo cursar psicologia saiba também de uma das facetadas da nossa realidade atual.
Piso salarial
Em nossa área, na psicologia, não existe um piso salarial. Para a área da psicologia clínica, mesmo que houvesse um piso, seria um pouco sem sentido, pois o serviço de atendimento psicológico é geralmente um serviço ao consumidor final (o que, em inglês, se denomina b2c – business to consumer) e não um serviço a uma empresa (b2b, business to business).
Portanto, como os pacientes ou clientes são os indivíduos que vão contratar o serviço, o pagamento recebido não será integral, de uma vez, como um contracheque quando trabalhamos em uma empresa. Por isso que digo que para a psicologia clínica, geralmente, a questão do piso salarial seria praticamente irrelevante.
Tabela de honorários (2013)
O que muita gente não sabe é que existe uma tabela de honorários criada pelo CFP (Conselho Federal de Psicologia). Nesta tabela, existe um valor mínimo, um valor médio e um valor máximo a ser cobrado por cada serviço.
Para a psicoterapia individual, que é o trabalho mais comum da psicologia clínica no consultório, nós temos:
Valor mínimo: R$ 81,62
Valor médio: R$118,18
Valor máximo: R$139,93
Curioso como o mercado não acompanha essa tabela. Por um lado, é muito fácil ver que o limite inferior não é seguido, mas o limite superior também não. Muitos profissionais cobram bem mais por uma única consulta.
Planos de saúde e psicologia
O meu argumento no outro texto – Por que os psicólogos ganham tão mal? – é de que a psicologia não está fora do sistema econômico no qual vivemos. Não é um argumento sem sentido, pelo que me parece… então, se é verdade que a psicologia está inserida em nosso sistema capitalista, a prática profissional será o oferecimento de um produto (como um livro, um teste psicológico, um curso ou uma palestra em dvd, etc) ou um serviço (uma avaliação psicológica, a aplicação de um teste, recrutamento, seleção, clínica, etc).
E, por regras simples da economia, da economia mais básica, podemos entender como os preços variam de acordo com a demanda de pessoas querendo o produto ou serviço e de profissionais ofertando o produto ou serviço.
Alguns exemplos:
O livro Comportamento Verbal, de B. F. Skinner encontra-se esgotado. Portanto, existe uma baixa oferta deste produto. Resultado: quem está vendendo nos sebos está vendendo pelo triplo do preço de um livro novo! Afinal, a demanda existe, mas a oferta praticamente não.
Um outro livro de Skinner que não estiver esgotado não será vendido com o valor tão alto, é claro. Na verdade, o padrão é que seja vendido mais ou menos pela metade do preço do novo.
Um palestrante conhecido nacionalmente pode cobrar, por exemplo, 15 mil reais por uma palestra. Para ele, existe muita demanda, ou seja, muitas faculdades, cursos, empresas procurando pelo seu serviço. E como ele é um só, o seu tempo será limitado. Portanto, a oferta será limitada. Com isso, o valor sobe e inclusive ele pode chegar a recusar a oferta de 15 mil para receber um valor maior.
A mesma simples equação pode ser colocada na questão dos planos de saúde. Um plano de saúde, em tese, seria benéfico para todos:
– usuários (que pagam um valor mensal e tem acesso a diversos profissionais);
– profissionais (que aumentam a sua base de pacientes – clientes);
– plano de saúde (que ao unir usuários e profissionais fica com a diferença).
Entretanto, esse intermediário, que é o plano de saúde, fará de tudo para reduzir os custos e aumentar os lucros. Óbvio pois toda empresa visa o lucro. Para reduzir os custos, pagará valores baixos para os profissionais e para aumentar os lucros aumenta o pagamento mensal do usuário.
Com isso, o usuário reclama do valor mensal que paga e o profissional do valor que recebe pelo seu trabalho.
Tomando por base a tabela de honorários do CFP, é fácil ver como os planos de saúde (mesmo os do governo, como o plano de saúde da Polícia Militar, por exemplo) estão muito longe do mínimo sugerido. Se o mínimo sugerido é 81,62 reais, o que o profissional recebe fica entre 15 a 25 reais. Já ouvi que alguns planos em São Paulo pagam para profissionais de saúde – não só psicólogos – algo como 8 reais por atendimento.
Vantagens e desvantagens do plano de saúde para os profissionais
Então surge a questão se é uma vantagem ou não estar ligado a um plano de saúde. E, para dizer sobre o valor de algo, evidentemente, temos que fazer um julgamento de valor. E, na medida em que cada pessoa tem um valor e uma perspectiva, cada um vai acabar avaliando se vale ou não a pena ter pacientes ou clientes advindos dos planos de saúde.
A vantagem, em tese, seria ter acesso a um número maior de pacientes ou clientes. Ou seja, ter o consultório cheio e, assim, ganhar “na quantidade”.
Digamos que o valor oferecido por um certo plano de saúde seja de 20 reais por sessão (já deduzidos os descontos e impostos). Se a sessão for de 1 hora, teríamos que em um dia, com 10 pacientes, o profissional ganharia 200 reais. Em 20 dias trabalhados, ganharia 4.000 reais.
Estes números são hipotéticos, para deixar claro.
Mas o que parece trazer insatisfação é a dificuldade de atender 10 pacientes por dia. Certamente, não é um trabalho pouco exigente. É preciso estudar muito e, além disso, ter bastante equilíbrio para lidar com todos os casos.
A insatisfação também vem da comparação com outras faixas salariais, na psicologia e em outras áreas.
Conclusão
Bem, como disse no início, gostaria de abrir a discussão. Coloquei alguns dados específicos e algumas opiniões próprias.
Em minha vida profissional, já trabalhei com planos de saúde que pagavam 25 reais por sessão (15 reais no final com os descontos). A questão que surge é sobre o objetivo do profissional. Eu, particularmente, penso que a área da saúde envolve algo mais além do dinheiro. Melhor dizendo, não trabalhamos apenas pelo dinheiro.
Em alguns textos aqui, mencionei como professores brilhantes que tive atendiam por preços sociais (10 reais por sessão) aqueles que não podiam pagar. Lacan, por exemplo, chegava a não cobrar daqueles que não podiam, mas queriam de verdade fazer análise. Depois, quando voltavam a ter condições, pagavam um valor simbólico.
Mas, claro, o profissional precisa pagar as suas contas e ter a sua vida. Por isso, a questão continua em aberto. Não existe muita esperança no curto prazo de que a lei de um piso salarial para a nossa categoria passe (estaria por volta de 4 mil reais o piso, o mínimo). Por outro lado, para a psicologia clínica, como disse, ter um piso não seria uma garantia de ganhar o piso, porque o pagamento é feito individualmente.
Uma outra questão é sobre a tabela de honorários não funcionar na prática. E não funciona porque os profissionais que precisam vão aceitar os valores oferecidos pelos planos de saúde que são menores, ou por precisarem ou porque querem ajudar os pacientes.
De toda forma, parece haver um descompasso e uma distância entre os psicólogos e seu Conselho, bem como entre o Conselho e a realidade do mercado.
Dúvidas, sugestões, comentários, por favor, escreva abaixo!
Absurdo o que os planos de saúde para u profissional de psicologia, trabalho há mais de 08 anos e o valores não são reajustados. Variando de R$ 20,00 a R$ 25,00 .Enquanto outros profissionais de saúde, o valor difere , isto é bem maior.Temos que fazer algo para reverter essa situação.Obrigada pelo espaço.
Mas a questão é: como fazer essa cobrança? Seria trabalho do conselho, do sindicato ou dos profissionais que deveriam recusar atender por valores tão baixos!? Realmente é algo desanimador.
Olá Maria do Socoro e Edson!
Bem, do ponto de vista dos planos de saúde, quanto menor for o valor pago aos profissionais, melhor. A questão é que a saída não é apenas uma ação individual de um profissional, pelo que vejo.
Em outras categorias profissionais, foi através da união de todos que houve força suficiente para aumentar os valores oferecidos. Isto deveria ser organizado pelas instituições como os sindicatos e os Conselhos Regionais de Psicologia e o Conselho Federal.
Mas, evidentemente, cabe a cada profissional também avaliar se compensa para ele atender ou não.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Bom dia,
O problema com os planos de saúde não é apenas o valor repassado aos psicólogos, mas também o fato de muitos contemplarem apenas 1 consulta por mês. O que não ajuda muito com a realidade dos tratamentos psicológicos.
Olá Evelyn,
Este é um outro aspecto interessante para comentarmos. Muitos planos de saúde são gratuitos para o usuário (a empresa paga o convênio). Por isso, para este cliente o tratamento é gratuito. Como sabemos, o ideal é que o cliente se comprometa pagando algo – ainda que um valor simbólico – porque senão, as chances de ele não se comprometer com o tratamento são grandes.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Boa noite! Como meu ultimo comentário não foi aceito pelo moderador estou fazendo mas este também não me preocupando com sua aceitação ou não mas como foi aberto esse espaço para comentários farei o meu. Acredito que o baixo valor da remuneração na área da psicologia se deva a falta de conhecimento por parte das pessoas nos resultados que a terapia possa trazer onde ao meu ver o individuo esta atrás de um atestado para abonar o dia faltado ou atestado para afastamento do serviço. Os profissionais da área pecam no sentido do pouco ou nenhum esclarecimento no que tange fatos reais e sem divagações dos resultados benéficos dos tratamentos ao leigo que acha que não deve procurar o psicólogo pois só quem esta “louco” é quem procura esse profissional. Por que não mostrar o quanto determinadas psicopatologias trazem de prejuízo as empresas e aos cofres da nação? Falta esclarecimento dos prejuízos sócio econômicos , além da união da classe pressionando o conselho a fiscalizar pois vejo que a maioria dos conselhos só servem para eleger presidentes e cobrar anuidades dos profissionais, mas defender o profissional bem pouco. Um grande abraço professor.
Olá Felipe, provoquei o assunto e agora vou te explicar o porque ou melhor, reproduzir uma parte do texto que recebi da ANS como resposta sobre os valores pagos pelos planos de saude aos psicologos. ” A remuneração, os direitos e as obrigações contratuais são livremente negociados entre operadoras e prestadores. Com relação ao reajuste, a lei determina que NA FALTA DE UM ÍNDICE EXPRESSO no contrato E NA INEXISTENCIA DE UM ACORDO ENTRE as partes, será aplicado o índice de reajuste definido pela Agência” ou seja o CFP que deveria ter criado o índice em comum acordo com a classe sindicato e ANS, se omitiu e é exatamente por este motivo os planos de saude pagam o que bem entendem! , tenho uma pagina de mobilização aqui na bahia no facebook https://www.facebook.com/pages/Em-favor-de-remunera%C3%A7%C3%A3o-digna-aos-profissionais-da-Psicologia/1447005368932135?ref=bookmarks e abri um abaixo assinado para todo e qualquer psicologo que queira assinar http://www.peticaopublica.com.br/psign.aspx?pi=BR82157 os endereços estão aí para quem quiser se interar do assunto, agradeço sua boa vontade em fazer o texto ele será compartilhado na minha pagina do facebook para todos possam ler e entender ! espero contar com o apoio dos seus leitores
abraço
Valéria Falcão Brandão
CRP 03-6830-BA
Infelizmente o conselho finge que existe, e nós, psicólogos, fingimos acreditar na existência do conselho.
P.S: É só olhar a reportagem de capa da última Revista do Conselho de SP (fev a abril 2015) !
Olá Professor Felipe, boa noite!
Fico preocupado quando encontro textos como esse na internet, pois qualquer pessoa tem acesso e não como garantir qual conclusão ou como cada pessoa irá internalizar o assunto. O fato é que muitos pensam que psicólogos são elitistas e cobram caro e esse texto na minha opinião pode reforçar isso para muitas pessoas.
Trabalho há 6 anos como psicólogo clínico, não trabalho só pelo dinheiro, mas como citou preciso pagar as contas entre elas: psicoterapia, supervisão e constantemente cursos de extensão e especialização e acredito que só assim posso prestar um serviço de qualidade.
Portanto vamos rever sua matemática, que peço desculpas se achar rude meu comentário, será que essa conta vem de Marte!
Primeiro é absurdo atender 10 clientes em um dia e prestar minimamente um serviço digno e de qualidade para aquele que está na nossa frente muitas vezes com um grande sofrimento psíquico, segundo como atendo 10 clientes por dia e faço terapia, supervisão e estudo?
A média realmente pode chegar a R$ 20,00 por sessão, já com descontos, isso escolhendo bem o plano de saúde. Bom, precisamos ser prestadores de serviço para isso (PJ) certo? Depois vem a locação do espaço certo? Talvez uns R$ 1.000,00 + R$ 300,00 de condomínio, certo? Precisamos de uma atendente, certo? + R$ 1.800,00 de funcionário e encargos trabalhistas, certo? Minha locomoção certo? Minha refeição, certo? Só não sei que horas farei a refeição atendendo 10 por dia, certo? Realmente, não vejo como um psicólogo ter um “salário” de R$ 4.000,00 trabalhando com planos de saúde e nem imagino como serei chamado de professor um dia como é seu caso se eu conseguisse trabalhar nessas condições, porque não tenho dinheiro para ajudar pessoas e pagar para trabalhar. Por isso seu texto é muito preocupante, acho que seria de bom tom tirá-lo da internet.
Att,
João Benatti
Olá João!
Obrigado por comentar!
Não vejo motivo de retirar o texto. Inclusive o que você disse no comentário é quase o mesmo que disse no texto. Dou o exemplo de 10 pacientes por dia para arredondar a conta (é um exemplo hipotético como afirmo).
Nem sempre é preciso ser PJ para se vincular a um plano de saúde. Alguns planos de saúde aceitam PF e outra possibilidade é entrar em uma clínica multidisciplinar.
O valor mensal, realmente, com planos de saúde é complicado de se atingir. O que infelizmente vemos não só na psicologia como em outras áreas são consultas mais rápidas, de 30 minutos, em vez de 1 hora.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Diante dessa omissão legislativa até ano de 1998,
surgiu uma divisão acerca da aplicação da legislação aos contratos celebrados após em direção a entrada em vigor
da Lei 9.656/98 e os celebrados anteriormente.
A projeção preocupa.
O problema é que o próprio conselho admite e lamenta esse preço sem fazer nada por isso!
Essa discussão é bem pertinente. Na prática, a situação exposta, resulta em muito desgaste para o profissional de psicologia. Desde a minha formação sempre questionei o enquadre da atuação no sistema financeiro. E, durante a atuação, percebo uma distancia entre a realidade e o discurso dos profissionais. A discrepância entre o que é exigido do profissional e o retorno beira o insano. A instrumentalização é caríssima e os valores pagos pelos serviços não cobrem as despesas. Os órgãos de representação tem papéis específicos e, em geral, não se envolvem no que não é de sua alçada. O profissional está a deriva. Esse idealismo de ajudar os pacientes torna-se um fator de adoecimento. Na realidade poucos conseguem acessar serviços de suporte. Vale para todos, sem condições dignas o trabalho resulta prejudicado. Claro, que ninguém consegue atender 10 pacientes por dia, 7 dias por semana… creio que uma saída, seja a mescla de atividades diferenciadas, que se complementem sem gerar desgaste para o profissional… até que, como em qualquer profissão, a sociedade consiga dar o devido valor a atuação.
Como profissional sem pós-graduação e formado há 2 anos, vejo com muita preocupação essa realidade. Recebo 20R$ de plano de saude. E isso torna impossível arcar com os custos de casa, quanto mais fazer pós. A gente acaba investindo na profissão por amor, pois o investimento não volta. Na verdade até volta, mas somente a base de um esforço sobrehumano ou depois de longos anos de experiência profissional. E enquanto isso o conselho só quer saber da anuidade.
Sou dentista e na odontologia acontece a mesma coisa , a concorrência aumentou muito , juntamente com as franquias e nos consultórios particulares acabamos tendo que atender convênios! E o nosso conselho também não faz nada! Infelizmente tudo está muito difícil!