Sobre resistência, persistência de um sintoma ou problema e mudanças.
Olá amigos!
Existe uma frase que é atribuída a C. G. Jung – e que infelizmente eu não consegui localizar em qual livro – que é fantástica para considerarmos algumas questões importantes do nosso funcionamento mental e emocional. A frase diz o seguinte: “O que você resiste, persiste”. Procurando pela versão original, encontramos a inglês, que é a versão literal: “What you resist, persist”.
Como não poderia deixar de ser, no alemão é um pouquinho diferente: “Wogegen du deinen Widerstand richtest, dem schaffst du Bestand”. Em uma tradução livre, teríamos:
“Aquilo contra o qual você aponta a sua resistência, consegue permanecer”.
É claro que o sentido da frase é o mesmo, mas ao mesmo tempo, as nossas associação acabam não sendo idênticas a partir da frase como é comumente traduzida e como é originalmente. Afinal, traduzir é trair, como diz o famoso ditado: “Traduttore, Traditore”. Porém, isto não é culpa do tradutor, e sim das diferenças entre os campos semânticos de uma língua e outra.
Enfim, voltemos à frase.
Aquilo contra o qual você aponta a sua resistência, consegue permanecer
Para explicarmos, então, o sentido da frase fica mais fácil se pegarmos alguns exemplos. O conceito de resistência na psicanálise descreve um comportamento no qual o paciente, instigado a falar sobre qualquer coisa que lhe vier à cabeça pela associação livre, resiste e não quer falar. Como se dissesse para si mesmo e para o seu analista: “eu não quero pensar nisso”.
O problema é que isso que não se quer pensar não vai simplesmente sumir e desaparecer. Um exercício simples consiste na seguinte atividade:
“Nos próximos cinco minutos, não pense – de forma alguma! – na sua mãe”.
Faça a experiência e depois nos conte. Acontece parecido quando temos uma preocupação qualquer e queremos nos ver livre do conteúdo da preocupação. E é aqui que entra a frase do Jung: “Aquilo contra o qual você aponta a sua resistência, consegue permanecer”.
Se aponta a sua resistência para a sua mãe, e não quer ou não pode pensar nela, paradoxalmente, você vai pensar muito mais nela. Não só porque você tem que pensar primeiro para conseguir não pensar, como você está em uma luta interna com um conteúdo que está dentro de você, na sua cabeça. Não é a mesma coisa do que afastar um objeto no mundo externo.
Como aquela frase que diz:
Aceite para mudar
A partir do que falamos acima, surge a questão: como fazer então se aquilo que não queremos ver, sentir, tocar é aquilo que vai conseguir permanecer?
Bem, é extremamente simples. Aceitar para mudar. Ser sincero – consigo mesmo – para encontrar a própria verdade. Dizendo deste modo pode parecer moralista, mas não é.
Por exemplo, digamos que você tem que fazer uma atividade X. O problema é que você não quer fazer. Então você pode procurar afastar de todos os jeitos a atividade e até a lembrança de que você tem esse dever. Contudo, de tempos em tempos você tem que lembrar para não se lembrar. Ou seja, em vez de um sofrimento, são dois. Talvez três: a tristeza ou raiva de ter que fazer e não querer fazer, a preocupação de ter que protelar…
E como funciona a aceitação para a mudança?
Primeiro, aceitar o que é a atividade X e aceitar que não se quer fazer. Esta é a sinceridade exigida em uma análise ou processo terapêutico. Aceitar a própria responsabilidade. Esse é o primeiro passo.
O segundo é analisar os motivos e as possíveis implicações de fazer ou não a atividade X, talvez como alternativas: aceitar que não se quer fazer e não fazer, enfrentando as consequências. Ou fazer porque tem que ser feito e fazer para acabar com o conflito interno o quanto antes. Segundo Jung: O livre-arbítrio é a capacidade de fazer com alegria aquilo que eu devo fazer (
Outro exemplo de aceitação é de aceitar um problema, ou melhor, aceitar que existe um problema. No caso de dependência química, como cigarro, álcool ou outras drogas (sabia que o vício em café é também considerado uma dependência química?) o primeiro passo – como sabemos – é aceitar a condição de dependente. Antes disso, não é possível nem começar de verdade um tratamento que queira ser duradouro.
Assim como qualquer outro sintoma psíquico. Infelizmente, as pessoas geralmente conseguem perceber que existe algo errado com o seu corpo, mas não conseguem admitir que existe, ao menos não de imediato, algo de errado com seus sentimentos e pensamentos, com sua psique.
Por exemplo, ter dificuldade de sentir ou dizer o que sente, ter ciúmes, insônia, tristezas sem motivo aparente, problemas de relacionamento, etc.
A questão é que fugir e não admitir que existe um problema, é claro, não vai resolver o problema. Porque o problema vai conseguir permanecer e talvez até piorar com o tempo. No melhor dos casos, continuará com igual intensidade. Porém, não terá sido resolvido. Uma boa forma de considerar é pensar no alívio de realmente resolver uma dificuldade.
Pense: como seria a sua vida sem esse problema (emocional, mental, preocupação, dúvida, incerteza, medo) que te incomoda hoje?
Conclusão
Havia muito tempo que não escutava Alanis Morissete. Ela tem algumas letras ótimas. Escrevendo este texto, me lembrei da música Everything – que inclusive é um excelente exemplo para os vários tipos de eu que tratamos em um texto anterior – Os 3 tipos de eus (self) na ACT
Na música Everything, Tudo, ela diz:
“What I resist persists and speaks louder than I know
What I resist you love no matter how low or high I go”
O que eu resisto, persiste e fala mais alto do que eu sei
O que eu resisto, você ama não importa quão alto ou baixo eu vá
Muito interessante! Ela encontrou alguém que aceita o que ela mesma está rejeitando…
Parabéns, Felipe! Obrigada por compartilhar algo tão maravilhoso!
Você foi muito feliz e assertivo em suas ponderações e fechou com chave de ouro com essa música tão bem interpretada e pertinente ao conteúdo do seu texto brilhante.
Todo sucesso do mundo pra você!!!
Obrigado Márcia!
Todo sucesso do mundo pra você também!
Olá Felipe!
Ótimo texto e belo exemplo de música.
Abraço,
Malu
Muito legal, conheci hoje o site e estou amando tudo que já consegui ler, e olha que já li bastante e já divulguei e recomendei no facebook dos meus colegas de classe!
Sou aluna de psicologia entrando no quinto semestre. Psicologia virou meu dia-a-dia, e estou muito contente em poder cursar essa arte! rs, considero a psicologia uma arte das mais inspiradoras!
Oi Felipe,gostei muito do modo que você aborda de forma clara e objetiva,e você usou uma ferramenta poderosa para contextualizar a música.Compartilhei com meus amigos e colegas,Parabéns
Linda música, tudo a ver com o texto. Perfeito. O livro “Efeito Sombra” de Deepak Chopra cita muito Jung e nossa projeções. Fica a dica.
Eu estou vivendo esse grande conflito interior.
Eu li essa frase e nunca mais me esqueci dela,por isso busquei no gogle algo a respeito dela e caí aqui.
“Tudo que você resiste,persiste.”
Realmente eu não sei como tirar uma pessoa da minha cabeça e isso está me causando um grande sofrimento.
Gostei muito desse texto me fez repensar