Sempre me perguntei qual curso fazer, pois sempre gostei de todas as áreas do conhecimento. Quando comecei a cursar História, todos os professores me diziam que eu estava no curso errado, que eu deveria cursar Filosofia. A questão é que até um ano antes de minha formatura no curso de História, eu pensava nos motivos que levaram os professores a afirmarem minha “veia filosófica”. Somente quando comecei a estudar Filosofia é que percebi no que ela consiste e me identifiquei com tal campo de estudos.

Em geral, o filósofo é aquela pessoa curiosa por natureza, curiosidade esta que se mostra desde os primeiros anos de existência através da pergunta: “Por quê?”. A Filosofia inicia-se, então, com nosso espanto, com nossa admiração pelas coisas do mundo, ela vem de nosso choque com a realidade de nossas crenças ou então com o choque direto com os objetos que se apresentam a nós.

O questionamento filosófico recai sobre as crenças humanas as quais impactam nossa vida cotidiana: temos a crença na existência do mundo que vemos fora de nós; temos a crença de que pelo passado podemos nos guiar no futuro; temos a crença de que alguns atos são moralmente reprováveis e outros são corretos; temos a crença em um determinado padrão de beleza; temos a crença de que determinados tipos de governo são melhores do que outros, temos a crença na existência ou não de um plano superior, transcendental, etc.

Normalmente, não questionamos tais crenças tomando-as por óbvias, evidentes, conhecidas e aceitas por todos. Estas são, pois, alvos da pergunta basilar da Filosofia: “Por quê?”. A mente filosófica tenta investigar, assim, a razão da coisa ser de determinado modo e não de outro, isto é o que justifica determinada coisa ser assim.

Mas qual é a utilidade de tais questionamentos? Tais questionamentos moveram as ciências, auxiliaram os cientistas em suas descobertas acerca da natureza, por exemplo, de suas leis e modo de funcionamento. Avanços morais e políticos também se devem ao questionamento das crenças, como notamos nos casos do questionamento do papel social da mulher e no questionamento do que deve fundar um Estado. Enfim, o “tino filosófico” liga-se à tentativa de conhecer o Universo como um todo, sendo que as perguntas filosóficas sempre se ligam a diversas àreas do conhecimento e não somente à Filosofia: ligam-se à Matemática, à Biologia, à Química etc.

O filósofo enfrenta problemas fundamentais relativos à existência, ao conhecimento, à verdade, aos valores morais, estéticos, à linguagem e à mente. Classificações e divisões dentro da Filosofia são sempre arbitrárias, todavia, para fins acadêmicos, os problemas filosóficos são agrupados – tradicionalmente – nas seguintes áreas temáticas: metafísica, epistemologia, lógica, estética, ética e filosofia política.

A metafísica, basicamente, tenta descrever os fundamentos, as condições, as leis, as causas e os princípios, a estrutura básica, o sentido e a finalidade de toda realidade e de todos os seres. Como exemplo, temos as questões: “De onde veio o mundo?”; “Quem criou o mundo?”; “Existe Deus?”; “Existe diferença entre matéria e espírito?”; “Existe livre-arbítrio?”; “Existe o conhecimento de Deus?”; “A alma é imortal?”; “Há algo que permaneça perante todas as mudanças que vemos nos objetos que se apresentam no mundo?” Bem, estas são os problemas centrais dos quais se ocupam a metafísica, todavia, não são os únicos.

A epistemologia é um campo de estudo que se atém às questões da origem, natureza, possibilidade e validade do conhecimento. Como exemplo, temos os seguintes problemas:“O que é o conhecimento?”; “Como acontece o conhecimento dos objetos?”; “Quais tipos de objetos podem ser conhecidos pelo homem?”; “O que faz que um conhecimento seja válido e verdadeiro?”.

A lógica abarca o problema do uso do raciocínio válido, isto é, questiona as formas argumentativas válidas., quais tipos de formas de raciocínio devem ser utilizadas para que o argumento seja válido (raciocínio indutivo, abdutivo ou dedutivo). Como exemplo da aplicação concreta de tais problemas, temos a lógica como instrumento fundamental para as ciências da computação na criação das programações.

A ética é o campo da Filosofia que busca a fundamentação das ações morais através do uso da razão, pretendendo ser um guia prático para ações humanas. Este campo se relaciona ao modo como devemos viver; no que consiste o agir moral perante os problemas que enfrentamos no mundo; aos questionamentos sobre o que é certo e errado, sobre o que é bom ou mau: “O aborto é certo ou errado, é bom ou mau?”; “O que é certo?”; “O que é o bem?”; “O que é o mal?”; “O que é a moralidade?”; “O que é a justiça?”; “O que é a injustiça?”.

O estudo da Filosofia Política centra-se no modo como organizamos nossas sociedades, isto é, no modo como fazemos tal organização e do que tal organização necessitaria para ser melhor. Como questionamentos, temos: “O que é a liberdade?”, “O que legitima um Estado?”; “O que é a igualdade”; “O que é a justiça?”; “Quais são os direitos do homem?”; “O que levou os homens a se organizarem e se juntarem em um Estado?”; “O que é o bem comum?”.

Por fim, a Estética é um campo da Filosofia que tem por objetos a natureza do belo e os fundamentos da arte, ou seja, atém-se ao julgamento e à percepção do que é tido como belo, à função deste belo perante a sociedade, a relação deste belo com a arte e a técnica artística, a relação entre a obra de arte com seu criador. Sendo assim, o centro dos questionamentos estéticos recai, pois, nas seguintes questões: “O que é o belo”?; “O que a obra de arte deve representar?”, “O belo e a obra de arte possuem alguma função perante o social?”.

Portanto, os campos dos problemas filosóficos são bem abrangentes e expõe um imenso debate de argumentos racionais que visam solucionar os problemas propostos. Deve-se ter em mente que neste texto, tenho a intenção de explanar breve e genericamente no que constitui o “espírito do filósofo”, isto é, com quais problemas ele se ocupa. Não tenho a pretensão, de modo algum, de expor com profundidade o problema da divisão da Filosofia nestes campos e nem de aprofundar os temas. O que desejo é levar você, o leitor, a se questionar se possui o espírito inquiridor do filósofo.

Se você é uma pessoa de curiosidade ilimitada cuja preocupação se atrele às várias áreas do saber (Matemática, História, Biologia, etc), se você busca explicações para tudo que é dado como verdadeiro e óbvio, se você sempre busca “algo a mais das coisas”, algo que não se vê no primeiro olhar, provavelmente tem o espírito filosófico. Devemos ter em mente, porém, que o filosofar não pode ser descrito como o ato de “estar com a cabeça nas nuvens, fora do mundo”. Filosofar parte do mundo, das coisas como se apresentam no mundo, das necessidades humanas de explicar e aprimorar o mundo que habitamos. Logo, o ato de filosofar é um enfrentamento de si – dado que questionamos nossas crenças – e um enfrentamento do Universo ao nosso redor.

Veja também – O que é Filosofia Clínica?

Michelle Vaz é graduanda em Filosofia