Durante a graduação, o mestrado e o doutorado eu tive que fazer 3 vezes a disciplina de Metodologia Científica. Não é das matérias mais agradáveis de se fazer, mas sem querer, acabei me tornando de carta forma um especialista.
A querida Professora Dylia Lisardo Dias, no mestrado, me deu uma dica fundamental: ter um objetivo claro em mente. E ela, como uma pessoa dedicada e eficiente, foi um passo além: sugeriu que todos nós escrevêssemos ou imprimíssemos os objetivos gerais e específicos e pregasse em uma parede visível ou deixasse bem próximo da escrivaninha ou do computador, afixado.
A ideia é justamente essa: afixar qual é o objetivo geral e qual é o objetivo específico para não nos desviarmos desse objetivo e começar a estudar o que não tem que ser estudado (para o TCC, dissertação ou tese).
Em primeiro lugar, é importante lembrar que mesmo que você seja uma acadêmico(a) e tenha um profundo interesse em pesquisas, você tem um tempo limitado. Portanto, por mais que você tenha boa vontade e tudo ao seu dispor (biblioteca, orientador, possibilidade de comprar e importar livros e materiais), o seu tempo é limitado.
E para superar este pequeno problema, você tem que ter um objetivo de pesquisa muito bem definido e ter este objetivo sempre em mente.
Como definir o objetivo
No livro Como se faz uma tese (que recomendo que você compre), Umberto Eco – sim, aquele mesmo do Nome da Rosa – nos dá um exemplo sensacional sobre como definir um objetivo. Ele conta a história de um estudando que queria fazer um trabalho de conclusão de curso sobre símbolo.
O objetivo dele era este: estudar o símbolo. Ora, existem centenas de autores que falaram sobre símbolo: autores da filosofia, da psicologia, da semiótica, etc.
Ou seja, o tema – símbolo – é excessivamente amplo.
Para resolver esta dificuldade, a ausência de tempo de estudar o símbolo na história da cultura ocidental (este pode ser um projeto para a vida, mas não para um TCC), temos que delimitar o tema.
E, basicamente, existem duas possibilidades:
1) Delimitar por autor e obra: O conceito de símbolo na obra Símbolos da Transformação de C. G. Jung
2) Delimitar por período histórico e fazer uma tese panorâmica: O conceito de símbolo nos autores pós-junguianos (1961-2000)
O primeiro tipo é mais aprofundado e nada geral, enquanto o segundo tipo é geral e nada aprofundado.
Tendo o objetivo geral em vista (que vai ser semelhante ao título do trabalho), podemos agora definir os objetivos específicos. Em síntese, os objetivos específicos são o passo-a-passo para você atingir o seu objetivo geral.
Por exemplo, para estudar o conceito de símbolo nos autores pós-junguianos, eu tenho que:
1) Definir o que é uma autor pós-junguiano e as respectivas linhas: escola junguiana clássica, escola da psicologia arquetípica, escola desenvolvimentista, etc.
2) Catalogar as obras destes autores em que o tema do símbolo aparece
3) Descrever o que cada um deles disse sobre o que é o símbolo, como ele aparece, fenomenologia, etc…
Portanto, você tem um objetivo geral. Para concluir o seu trabalho e ter realizado o seu objetivo geral, você terá que ter passado pelos objetivos específicos. Pense sempre nos objetivos específicos como um to-do list, uma lista de passos a serem realizados com verbos que podem ser comprovados que foram feitos.
No final, você vai poder se perguntar: Eu defini o que é um autor pós-junguiano e as respectivas linhas? Eu cataloguei as obras destes autores? Eu descrevi o que cada um deles disse sobre o que é o símbolo?
Evite verbos que não são específicos de ações que podem ser riscadas como feitas como entender, compreender, pensar. Enfim, faça os seus objetivos específicos como ações determinadas, as quais poderão ser checadas se foram feitas ou não.
Um exemplo da necessidade de ter um objetivo claro
Eu agora gostaria de compartilhar com vocês a minha experiência no mestrado. Caso tenha interesse, você pode ler meu trabalho aqui: Um manuscrito de Joyce: a identidade narrativa (do artista) quando jovem
Primeiro, eu caí no erro inicial de querer estudar três livros enormes de Joyce: Stephen Hero, Um retrato do artista quando jovem e Ulisses. Isto porque o alter-ego de Joyce, Stephen Dedalus, aparece nos três. Problema, teria que estudar a fundo mais de 1500 páginas.
Fui orientando, então, a delimitar mais e escolhi o Stephen Hero, um manuscrito inacabado e pouco estudado (sem tradução para o português). Pronto: defini um objetivo claro e factível.
Para a parte teórica, escolhi o filósofo Paul Ricouer e seu livro O si-mesmo como um outro, no qual ele fala de dois tipos de identidade: a identidade ipse (mutável) e a identidade-idem (mais fixa).
Segundo, caí no erro de estudar muito mais coisa do que era necessário. Lendo Ricouer, nós vamos sentindo a vontade de estudar os autores que ele cita. Começamos com Gadamer, Heidegger e vamos voltando a Hegel, Nietzsche, Kant, Descartes, São Tomás de Aquino, Santo Agostinho, Aristóteles, Platão, Sócrates, Heráclito…
Quer dizer, não é que estudar todos estes autores é algo sem propósito. É que para os nossos objetivos acaba sendo perda de tempo. Ou seja, em outros momentos, podemos ir e fazer um curso de filosofia, mas para terminar o seu trabalho final, você não precisa estudar a Summa Theológica.
Em resumo: se você não tiver um objetivo claro definido em sua mente – e afixado na sua frente o tempo todo – você pode cair no risco de ir além do que você precisa estudar. E, novamente, não é que estudar tudo isso seja um erro, é um erro estudar em um momento em que você tem pouco tempo e tem que concluir o seu TCC, dissertação ou tese.
Conclusão
Para concluir, gostaria de frisar dois pontos fundamentais do texto de hoje:
– Defina o seu objetivo geral (parecido com o título do seu trabalho) e destrinche-o em um passo-a-passo que constituirá os seus objetivos específicos.
– Imprima ou escreva os seus objetivos e coloque atrás da porta, embaixo do espelho, do lado da TV, do computador, na tela do seu smartphone, enfim, deixe-os na sua frente para que sejam vistos diversas vezes por dia.
Deste modo, você não correrá o risco de se desvir e ir parar na filosofia grega antiga quando está fazendo um trabalho a respeito do século XX.
Importante: como sou da área de humanas, tenho mais contato com este tipo de pesquisa. Mas isto não quer dizer que as dicas sejam inválidas para as pesquisas em biológicas ou exatas. Especialmente a dica de manter os seus objetivos sempre a vista é fundamental para você ir direto ao ponto e entregar no prazo.
No próximo texto, falaremos sobre – Ler o necessário, fichar o melhor e citar o fundamental
Todas as Lições:
3) Ler o necessário, fichar o melhor e citar o fundamental
4) Escrever primeiro, revisar depois
Conheça também o meu trabalho de Orientação Acadêmica Online – TCC, Mestrado e Doutorado
Gostei do texto, porque embora pareça fácil limitar uma pesquisa, acabamos nos dispersando para outros assuntos, e os lembretes sempre ajudam a mantermos o foco, acho que podemos incluir isso em um projeto particular também que pode ser os objetivos a alcançar durante o ano todo e fazer lembretes, pois a tendência é mudarmos o foco e não concluirmos nada.
Estou gostando muito do curso, principalmente porque estou cursando Ciências Contábeis e preciso fazer o meu TCC, e as suas dicas são ótimas.
Sobre o link que você postou “Um manuscrito de Joyce: a identidade narrativa (do artista) quando jovem” ao clicar nele aparece o aviso de “página indisponível”.
Felipe, compreendi a ideia. Nesse sentido, preciso delimitar o conteúdo. Obrigada!
Olá Jean, tudo bem?
Fico feliz que tenha gostado!
Aqui o arquivo da dissertação abre normalmente. É um arquivo em pdf, ok?
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Está no ponto… E, agradeceria se me sugerisses algumas matérias de âmbito Criminal. Vasculhei na tua página a não encontrei. Se tiveres um link, agradeceria.
Abraços.
Olá Felipe.
Consegui fazer o download do arquivo :)
Olá, Felipe!
Gostei muito das dicas! Que bom que ainda existem pessoas como você, que está sempre inovando nas idéias para ajudar o próximo. Suas dicas muito tem me ajudado!
Um abraço!
Miriam
Olá Miriam!
Obrigado!
Fico muito feliz que esteja gostando das dicas!
Atenciosamente,
Felipe de Souza