Olá amigos!
Há uns dias estava compartilhando fotos antigas da época do mestrado (2008-2010) que fiz na Universidade Federal de São João del-Rei, passando tudo do orkut para o facebook. E um amigo meu comentou que não iria curtir tudo porque quanto mais você curte as postagens de alguém ou sobre um assunto mais aquilo aparece para você. E realmente, esta foi a genialidade do Mark Zuckenberg (criador do facebook), a criação do botão like (gosto em português de Portugal e curtir aqui no Brasil). É genial porque no feed de cada um começa a aparecer postagens, fotos, textos, vídeos que mais interessam e, ao mesmo tempo, a empresa vende o seu like para anunciantes.
É engraçado pensar nestas questões para quem não trabalha na área de tecnologia e usa as redes sociais apenas para se aproximar de amigos, familiares e conhecidos. O facebook é uma empresa – agora com papéis na bolsa de valores – cujo produto é você. Melhor dizendo, o facebook vende o seu perfil, com os seus interesses, para anunciantes que trabalham no nicho de mercado que você gosta. Assim, se você gosta de marketing, começa a ver anúncios de marketing, se gosta de moda, as propagandas são de moda e por aí vai.
Neste texto, quero falar sobre um aspecto que liga o sucesso do facebook com a psicologia. O criador deste site que possui hoje mais de 1.000.000.000 de pessoas, além de estudar ciências da computação em Harvard, também estudou psicologia por lá. Por isso, não é tão sem propósito fazer esta ligação e entender como a maior rede social do mundo foi criada, com base no botão curtir, mas na perspectiva inversa: ter a sua própria publicação curtida, no sistema de reforçamento estudado pela psicologia comportamental e chamado de reforço positivo intermitente de razão variável.
A psicologia comportamental
A psicologia comportamental não é minha área de especialização. Porém, tive dois excelentes professores lá na UFSJ, a Marina Bandeira e o Roosevelt Starling, dois grandes pesquisadores que muito me ensinaram.
Para quem não tem ideia do que eu estou falando, temos que pensar a psicologia como psicologias, no plural. Existem métodos e abordagens que são totalmente diferentes uns dos outros, mudando o olhar sobre como estudar de acordo com o país, a cultura, a língua de origem. Assim, a psicologia comportamental nasceu nos EUA, país extremamente pragmático e materialista. Tendo este horizonte de perspectiva, eles criaram toda uma linha de pesquisa dentro da psicologia, o behaviorismo ou comportamentalismo.
Um grande problema desde o começo da psicologia foi como estudar a psique, (palavra grega para alma). Como estudar os pensamentos? Como estudar os sentimentos? As associações de ideias? A vontade, o desejo? O inconsciente?
Para todos estes fatores, que sabemos existir internamente, temos dificuldades de observar nas outras pessoas. Se alguém está parado e em silêncio… como saber o que está pensando, sentindo, desejando, imaginando?
Bem, outras psicologias deram respostas ao seu modo mas a psicologia comportamental modificou totalmente o olhar. Sabemos o que alguém pensa, quando esta pessoa fala; sabemos o que ela sente, pelo modo como ela age, sabemos o que ela deseja pelo que ela faz ou tenta fazer… ou seja, estamos sempre estudando o comportamento. O objeto da psicologia, para a psicologia comportamental, portanto, não é mais uma entidade invisível e suposta (como a alma, o espírito, a vontade) mas sim o comportamento.
Para fazer jus à realidade dos fatos, temos que pensar em comportamentos abertos ou encobertos. Outra terminologia é comportamentos públicos ou privados. Os primeiros são os comportamentos que podem ser observados por outras pessoas (abertos ou públicos), enquanto existem outros comportamentos que são “invisíveis”, os comportamentos privados ou encobertos, como o pensamento.
Reforço positivo intermitente
Em outro texto, falamos sobre a evolução da psicologia comportamental. Veja aqui:
Behaviorismo de Watson e Skinner
Skinner, indo além da dinâmica causa e consequência, estímulo e resposta, introduziu para o estudo do comportamento, os estímulos antecedentes e os estímulos consequentes. É simples de entender. Digamos que vamos estudar o comportamento de postar uma foto no facebook.
Temos então:
Antes do comportamento – Comportamento – Depois do comportamento
Antes do comportamento nós temos os estímulos antecedentes e depois do comportamento nós temos os estímulos consequentes. Para analisar a probabilidade de um organismo emitir de novo um comportamento qualquer, temos que analisar esta tríade: antes, durante e depois do comportamento. Falamos então de 4 possibilidades básicas:
1) Reforço positivo
2) Reforço negativo
3) Punição positiva
4) Punição negativa
Reforço, em psicologia comportamental, diz respeito ao que vai fazer o comportamento aumentar de frequência, ou seja, a pessoa vai fazer mais aquele dado comportamento. Punição, por sua vez, significa tudo o que vai fazer o comportamento diminuir.
Vamos dar alguns exemplos:
Imagine um garoto que está desenhando. O comportamento que vamos observar, portanto, é o comportamento de desenhar. Em 10 vezes que ele desenha, digamos que em 5 alguém vem e fala que está lindo, que está muito bom, que ele é um ótimo desenhista. Ouvir esta resposta de uma outra pessoa é um reforçamento positivo. Positivo porque há a introdução de um estímulo. Reforço porque o elogio provavelmente vai fazer com que ele aumente o comportamento de desenhar.
A punição positiva aconteceria, se em 10 vezes, ele ouvisse em 5 (os números são até certo ponto indiferentes), que o desenho está horrível, que ele é um péssimo desenhista, que ele nunca mais deveria desenhar. Ou seja, é punição positiva, positiva porque há a introdução de um estímulo, a crítica, e punição porque provavelmente vai fazer com que o comportamento de desenhar diminua com o tempo.
Agora vamos imaginar que você está com dor de cabeça, um estímulo aversivo. Ao tomar um medicamento, a dor de cabeça passa. O efeito do remédio é um reforço negativo. Negativo porque há a retirada de um estímulo (a dor) e reforço porque provavelmente você vai tomar de novo o remédio quando tiver dor, ou seja, dizemos que há reforçamento porque há aumento na frequência da emissão do comportamento.
E, por fim, há a punição negativa. O exemplo clássico é quando a mãe coloca a criança de castigo por ter feito alguma “arte”, retirando o video-game ou a televisão. É punição porque provavelmente vai fazer com que a criança pare de emitir aquele comportamento. É negativa porque há a retirada de um estímulo (o video-game ou a tv).
E o que tudo isto tem a ver com o facebook e o seu incrível sucesso?
Facebook e o reforço positivo intermitente
Bem, tudo isto que falei sobre a psicologia comportamental é, evidentemente, uma introdução. Além destes quatro tipos de possibilidades, temos muitos outros esquemas de reforçamento. No exemplo acima, eu falei que o garoto recebia 5 elogios para cada 10 comportamentos de desenhar. A medida do reforço também é muito importante para podermos avaliar as probabilidades de que o comportamento continue.
Basicamente, falamos em reforço contínuo e reforço intermitente. O reforço contínuo é quando cada comportamento é reforçado após a emissão, sem exceção. Já nos reforços intermitentes (de razão fixa ou variável), o comportamento é reforçado algumas vezes e outras não.
No reforço intermitente de razão fixa, o comportamento é reforçado após um número fixo de tempo ou de vezes. Um trabalhador trabalha 30 dias e no trigésimo dia, recebe o seu salário. A razão é fixa, o comportamento é reforçado sempre a cada 30 dias.
No reforço intermitente de razão variável, o comportamento é reforçado mas com um tempo ou com uma dada medida aleatória, randômica. E é aqui que chegamos ao facebook. Milhares de pesquisa demonstraram que o esquema mais potente, que cria os comportamentos mais constantes, são os que possuem um relação com o reforço intermitente de razão variável.
Pensando agora do ponto de vista do usuário do facebok, pense como se fosse você. Você posta uma nova foto. Será que o comportamento de postar uma nova foto será reforçado? Sim, 49 pessoas curtiram. O curtir dos outros (e as notificações do curtir) são o reforço positivo. Só que é intermitente, ou seja, não acontece toda hora ou não acontece com o mesmo número de pessoas curtindo. Por isso, é um reforço intermitente de razão variável.
Acontece de você postar um link ou um vídeo e ninguém curtir. Isto não é teoricamente um problema. Você não recebeu o reforço, mas também não houve punição.
Muitas pessoas pensam que seria interessante ter um botão “não+curti”, mas isto faria com que houvesse no facebook a punição. E, lembrando dos conceitos, vemos que a punição é o que faz com que a pessoa pare de emitir um comportamento. Deste modo, se você postasse uma foto e tivesse lá 10 pessoas “não curtiram”, a tendência seria – com o tempo – de você ir diminuindo as postagens de novas fotos.
Por isso a genialidade do Zuckenberg e por isso o facebook fez e faz tanto sucesso, como nenhuma outra rede social fez até hoje. E, por estes motivos é que é tão “viciante”. As pessoas entram todo o tempo para saber se vão ser reforçadas. Se o esquema de reforçamento fosse fixo, digamos, as pessoas curtem sua foto apenas durante a manhã, haveria a probabilidade maior de você apenas entrar no facebook pela manhã. Agora, como você não sabe que horas terá o seu reforço, você vai ficando cada vez mais tempo…
Interessante notar que muitos adolescentes estão migrando do facebook para o tumblr. A grande diferença é que é possível ser anônimo no tumblr, que, por sua vez, mantém mais ou menos a mesma estrutura de reforçamento, como reblog (compartilhar), likes, notes (comentários). Se no facebook você tem que ter um perfil real, no tumblr você pode ou não mostrar quem é você.
O que vocês acham: já tiveram ou estão tendo uma fase de “vício no facebook”?
Muito interessante essa matéria! Como é gostoso saber o porquê das coisas!!! Agora, sobre o facebook, fico com raiva às vezes de pensar o quanto é viciante! Chega a ser uma obrigação tirar fotos de algo que está acontecendo só para postar e para esperar que as pessoas curtam! parabéns pelo site, Felipe! Está cada vez mais viciante lê-lo! rsrs
Viixxxiii!!! Eu tenho algum outro reforço mto sério, rss! Não tenho facebook e ele não me faz falta alguma, ah não ser qnd algum querido professor diz “entra no meu face e participipa do sorteio para ganhar o livro” aarrrgggg =S rsrsr!
Olá Roberta,
É engraçado vermos a aplicação de uma teoria – aparentemente pragmática, funcional e até árida – na nossa vida cotidiana, não é mesmo?
A psicologia comportamental é muito útil para entendermos muitos aspectos de nossas vidas…
Então, devo dizer que é, para mim, também um reforço positivo receber o seu comentário! =)
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Olá Sarah,
Até poderíamos dizer que a fala do professor funciona como um estímulo para que você crie uma conta por lá, não é mesmo?
Para o bem ou para o mal, às vezes temos que nos inserir em “modismos”, rsrs.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Era o que eu já imaginava. Ótimo texto. R+. Visando esta mesma linha quando há algo contra as regras do Facebook ele aplica uma PUNIÇÃO NEGATIVA, deixando o usuário por “X” dias sem usar.Fato este que possivelmente faz o mesmo ter um número enorme de FAKES “causando” gerando contra-controle de tal fato que acabam burlando tal punição.
Otimo!!! gostei! curti!rsrsrs…
Gostei muito do seu comentário, Felipe! Eu trabalho de graça, e não sabia. rsrsrs Realmente é fantástica a ideia do Mark, pois cada vez que curtem minhas fotos eu tenho vontade de postar mais fotos. E viciante! Assim como ler suas matérias! rsrsr
Olá Alessandro!
Obrigado!
Sim, este deve ser um grande problema para eles, porque o sistema desde o início propõe que cada pessoa física tenha uma conta única, com seu nome e informações reais. No começo, as empresas criavam perfis para divulgar seus negócios. Depois, eles mudaram e começaram a exigir que as empresas tivessem as páginas. Assim, muitos perfis fakes (de lojas e negócios) foram sendo desativados.
De todo modo, deve ser muito complicado gerir um site com mais de 1 bilhão de pessoas, rsrs.
Outro exemplo, é quando a pessoa adiciona muitos amigos, que não são amigos. Há também o bloqueio de 30 dias para não adicionar mais.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Olá José!
Fico feliz que tenha curtido! =)
Aqui no site, comentários (ainda mais positivos) são sempre como um reforço positivo, rsrs.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Oi Miriam!
Então, é engraçado vermos como o uso de um sistema – na internet – pode fazer com que você seja o produto, não é mesmo? O caso do face é ainda mais interessante, porque nós postamos realmente de graça e alimentamos assim um site que não é nosso. Para o usuário é até tranquilo isso, mas já vi muitos casos absurdos de grandes empresas que gastaram fortunas comprando likes, quer dizer, exibindo mais a página para que as pessoas curtissem. Depois, compravam conteúdo, fotos com efeitos complexos de photoshop, etc, para logo em seguida, o facebook mudar o seu algoritmo e todo este gasto ser jogado no lixo.
No começo, cada fanpage conseguia exibir o seu conteúdo para cerca de 15% de seus fãs. Já é pouco, agora está em 1%. Isto demonstra – para as empresas – que a melhor estratégia é não confiar num site (como orkut, face, twitter, youtube) que não seja o seu. As regras mudam e trabalhos de anos são inutilizados.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Estudo e não leio tuas postagens ,nesta deve ter passado desapercebido em outras que você estudou aqui na minha terra,São João del Rei,grande abraço Felipe e continue nos presenteando com estes estudos.
Olá Cristiano!
Sim, meu caro, estudei ai em São João del Rei entre os anos de 2002-2006 (graduação) e 2008-2010 (mestrado no Promel).
Terra muito interessante, muito peculiar, entre o passado e o futuro!
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Olà Felipe gosto muito de ler suas dicas,ajuda bastante,quando entrei em seu site foi por amor a psicologia,sou professora mais tenho 4 filhos bem diferentes e tem uma que é um pouco complicada quero entender um pouco seu comportamento, de rebeldia e carater forte se for possivel voce ma dar algumas dicas, agradeço muito. Valtenice.
Olá Valtenice,
Fico feliz que esteja gostando dos textos!
Nós temos uma planilha de pedidos de novos textos e já temos este tema em vista, ok?
Aguarde que, em breve, vamos publicar!
Atenciosamente,
Felipe de Souza
sou estudante de psicologia, iniciante, vou fazer o segundo semestre agora em fevereiro. sou apaixonada por tudo que fala de psicologia. estou apaixonada por este site, entro em todos os e-mails que vcs enviam. obrigada! são textos maravilhosos.
Olá Nair,
Fico muito feliz que esteja acessando os textos que enviamos por email. Ainda mais por você ser uma futura colega de profissão!
Se tiver sugestões para novos textos, é só comentar, ok?
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Parabéns Felipe! Gostaria de deixar aqui minha satisfação em poder estar participando deste grupo, pois até o momento todos os textos que venho acompanhando estão me proporcionando um reforço positivo para continuar lendo os novos textos..rsrs.. Gostaria se possível sugerir o tema “Dependência Química”, penso que seria interessante discutirmos tal tema, visto que esta sendo considerada a doença do século por alguns estudiosos. Agradeço, Marli Rodrigues
Olá Marli!
E para mim é um reforço positivo ter comentários como os seus! rsrs
Bem, sobre Dependência química, veja aqui – Dependência Química: Definição, tratamentos e clínicas
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Obrigada!
Abraços,
Marli Ap. F. Rodrigues
Olá Felipe! Excelente matéria! Impressionante como somos manipulados e nem percebemos. Tenho amigos que não tem conta no face e hoje entendo porque. Acho que você deixa de viver e acaba vivendo em função das publicações das pessoas e acaba não sentindo falta de ver elas pessoalmente, porque vc já está atualizado sobre a vida delas. Você indica algum livro sobre psicologia comportamental? Parabéns novamente pela matéria.
Olá Cristiane!
Obrigado!
Fico feliz que tenha gostado do texto!
Bem, não sei se é uma questão de abandonar as redes sociais. Em muitos sentidos, o facebook, twitter, Linkedin, youtube, podem ser, inclusive, excelentes ferramentas de trabalho. A questão é só saber usar, como tudo, não é?
Sobre livros, veja o nosso texto – Melhores livros de psicologia para começar a estudar
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Wau!
Já se tornou um vício dá uma espiadinha, do que o Felipe irá Postar hj,kkk…Olha o reforçamento positivo aíí…
Gostei mto do comentário,ainda não sou totalmente viciada,e tbem devo dar pouco lucro…..mto bom.Admiro seu trabalho,obrigada.
Raciocínio Brilhante!!! porém seria muito mais prazeroso se as pessoas recebessem um reforço positivo pela sua própria personalidade, acontecem casos de usuários pelo vicio de serem curtidos e terem um reforço positivo das pessoas, se auto-sabotam mostrando comportamentos que não possuem, ideais que não adotam no seu dia a dia, os famosos usuários hipócritas…rsrsrsrs
Olá Ana Carla!
Muito interessante seu comentário!
Então, na verdade, as leis do comportamento estudadas pela psicologia comportamental são válidas no online mas também no presencial, rsrs. Quer dizer, um comportamento hipócrita, no cotidiano, pode ser emitido apenas pelo reforço anterior ou expectativa de reforço.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Sou desenvolvedor de sistemas para web e estou iniciando uma pesquisa sobre as redes sociais e o comportamento humano em cada uma delas para escrever um artigo no meu blog. Nesta pesquisa cheguei até este link e posso dizer que, sem dúvidas, este é o melhor texto que já li sobre o sucesso do Facebook. Como tenho certo apreço por psicologia (ainda estudarei isso como segunda formação), já imaginava que houvesse alguma relação com a psicologia comportamental, entretanto, não conhecia as as possibilidades de reforço e punição exemplificadas no texto.
Por fim, obrigado pelo texto professor! Você acaba de ganhar mais um leitor!
Abraços.
Olá Fernando!
Obrigado!
Fico muito feliz que tenha gostado do texto e do site!
Atenciosamente,
Felipe de Souza