“E por que é que as minhas sensações se revezam tão depressa?”

Esta frase é de um poema de Fernando Pessoa chamado “A passagem das horas“. Na verdade é de seu heterônimo, um outro eu além do eu mesmo, chamado Álvaro de Campos. É uma frase que daria, como deu, milhares de pesquisas, testes e teorias dentro da psicologia.

Por qual motivo as sensações mudam tão depressa? O que causa esta mudança? Sentimos o mundo como ele realmente é?

Tais perguntas são respondidas não somente pela psicologia como também pela medicina, pela bioquímica, pela neurociência.

Por exemplo, o sistema sensorial químico é responsável pela comunicação entre as células através de hormônios e neurotransmissores químicos. Mas podemos nos perguntar, além da biologia e da estrutura física, qual a relação que existe entre a sensação doce e um próton? Será que o modo como sentimos o mundo, através dos sentidos, nos dá uma percepção melhor do que acontece ao nosso redor?

William James, um dos psicólogos mais importantes de todos os tempos, escreve:

“Milhões de informações do mundo exterior chegam aos meus sentidos, mas nunca passarão a fazer parte da minha expêriencia. Porque? Porque elas não tem interesse para mim. Minha experiência é aquilo que me convém prestar atenção. Somente as informações que observo é que modelam minha mente – sem um interesse seletivo, a experiência é um caos total”.

Desta forma, podemos entender que selecionamos determinadas informações do ambiente ao nosso redor, tanto quanto das sensações corporais internas. Por exemplo, agora você lê este texto, mas é provável que não sinta atentamente o seu polegar direito ou sua orelha esquerda. Mas quando digo:

polegar

orelha

língua

Você automaticamente passa a perceber e sentir melhor estas partes.

Com isso, podemos ver que as sensações se revezam tão depressa por uma série de motivos:

Primeiro, cada sensação corporal é extremamente fluída, dura de picos de segundo até alguns segundos apenas. As sensações que parecem durar horas são, na verdade, a repetição com frequência de sensações menores.

Segundo, uma grande parte das informações recebidas (seja pela visão, audição, tato, paladar ou olfato) são selecionadas. Em outras palavras, não percebemos todas as informações recebidas. Algumas nos afetam mais do que outras.

Terceiro, o cérebro não apenas recebe as informações do meio, mas as analisa e compara constantemente com a experiência passada.

Com a seleção das sensações, podemos perceber – se atentarmos – que as sensações podem nos afetar de diversas maneiras e provocar sentimentos complexos e diferenciados. Um choro de bebê, o gosto amargo, uma imagem terrível causam em nós reações que em geral não controlamos. Tais reações, por sua vez, são comparadas com experiências anteriores.

É interessante observar que nossas sensações e sentimentos não são tão longas como geralmente supomos. As sensações mudam rapidamente e, desta forma, temos que concordar com a frase de Fernando Pessoa, que se questiona a respeito do motivo pelo qual as sensações são tão rápidas.

Uma resposta, então, mais geral, seria: as sensações se revezam tão depressa em virtude de nossa estrutura corporal e da relação entre o cérebro e o sistema nervoso.

A percepção que temos de cada sensação, especificamente, se dá por sua relação com nossa história. Um choro de bebe pode ser um dos sons mais irritantes para algumas pessoas. Para outras, será agradável, por trazer lembranças dos filhos…

E, por fim, podemos selecionar constantemente em que área do corpo queremos sentir mais e melhor. Podemos treinar para ficarmos mais conscientes das sensações internas (como respiração e batimento cardíaco) ou treinar um sentido que não desenvolvemos bem.

Por exemplo, começar a fazer aulas de música para começar a distinguir melhor os sons e ritmos; ou aulas de dança para conseguirmos controlar melhor os nossos movimentos, postura e equilíbrio; ou aulas de pintura para começarmos a selecionar determinadas informações visuais que não prestávamos tanta atenção anteriormente.

Para encerrar, também com Fernando Pessoa e seu maravilhoso poema:

“Sentir tudo de todas as maneiras,
Ter todas as opiniões,
Ser sincero contradizendo-se a cada minuto,
Desagradar a si próprio pela plena liberalidade de espírito,
E amar as coisas como Deus”.